Para a garota da classe da frente

Em algum lugar distante de você, outubro de 2010

Querida amiga, hoje venho por meio desta carta detalhar tudo o que passamos juntas e como você é importante pra mim.

Era exatamente 1999, mal sabia eu o que poderia acontecer naquele ano,   eu prestes a completar meus dez anos, e surgindo uma nova etapa a seguir, sem mesmo saber que o quarto ano naquela escola iria me proporcionar algo pra vida toda.

Desde que começou as aulas eu me sentia perdida, mesmo sendo uma menina conhecida por todos, afinal eu era a filha da antiga diretora da escola. Aquela que muitos temiam em brincar, não pelo fato de eu ir correndo contar para a minha mãe, porque na verdade nunca fui de fazer isso, sempre preferi resolver meus problemas sozinhos. Mas sim pelo simples fato da pessoa ser estressada mesmo. Até então não tinha amigos, e aquela segunda semana de aulas estava sendo chata demais, mas vou confessar que ao ver um ser tão pequeno quanto eu entrando na sala, foi amizade a primeira vista. Sem querer chamar a atenção, fiquei ali dimpé observando, quando vi que a professora havia chegado. Foram apresentados os colegas novos, que vieram de uma localidade um pouco carente, onde eles não tinham tudo que desejavam, mas lutavam para preservar o que construíram. Fiquei ali pateta olhando para todos e nem percebi que a menina que tanto chamou minha atenção havia roubado o meu lugar, é ela se sentou na terceira classe da segunda fila. O que me restou foi um lugar atrás do seu. E foi ali que me sentei meio sem jeito, olhando para aquela sala repleta de pessoas diferentes. Lembro-me que o nosso primeiro contato foi uma das desculpas mais esfarrapadas que alguém da para chamar atenção, pedi a borracha da garota emprestada. Ela simplesmente olhou para mim e disse que não tinha borracha. Eu fiquei um tanto envergonhada porque o meu estojo estava repleto de borracha de todas as corres. Quando ela se virou eu a cutuquei perguntando se ela gostaria de escolher uma das minhas. Seus olhos brilharam ao ver o monte borracha, e no meio de tantas bonitas ela escolheu a mais velhinha e disse que as outras eram muito novas pra ela. Eu não sabia qual reação ter frente aquilo, olhei para o seu material tão simples, suas roupas tão simples e eu ali poucos minutos antes de haver reclamado daquela chatice de escola. Novamente a cutuquei, perguntando o seu nome, ela apenas me entregou um pedaço de papel onde estava escrito Elisiane Batista de Oliveira, com uma letra incrivelmente linda. O sinal bateu e então fomos para o recreio, ela permaneceu sentada e então eu perguntei se ela não iria sair, disse que não que não tava acostumada com esse tumulto. Eu peguei na sua mão e disse: “deixa que eu te guio pela escola Lisi.” Ela me entregou um sorriso, e assim saímos.

Durante muito tempo aquela era a minha melhor rotina, a escola havia encontrado um sentindo e eu uma melhor amiga. Nossas tardes eram divertidas, sempre que possível Lisi ia para a minha casa, mas infelizmente eu não ia para a dela, pois meus pais não aceitavam que eu fosse num lugar que eu nem sabia como era. Pelo menos não fizeram nada contra a minha amizade com ela.

Quatro anos passaram depressa, mas as lembranças do ultimo final de semana de 2003 ainda estão na minha mente, àquela simples festa, a viagem um tanto quanto desastrosa, pessoas perdidas em uma que até hoje eu adjetivo por “estranha”, a despedida dos amigos do colegial e do meu lado, ela, a garota da classe da frente. Aquela que por durante vários anos me acompanhou, me dando as respostas para muitas perguntas, aquela que eu apoiei sempre, e que hoje eu tenho a absoluta certeza que nada e nem ninguém conseguiu separar. Aquela que me ensinou muita coisa, e que sua simplicidade me fez um ser diferente. Aquela que hoje mora na cidade vizinha, a que soube do meu primeiro beijo, da minha primeira paixão, aquela que me estendia a mão quando todos me ignoravam.aquela menina do cabelo claro, com alguns cachinhos quase desfeitos, da pele macia porém com marcas do quão forte ela era. Aquela que hoje é mãe de uma linda garotinha que eu tenho um carinho imenso. Aquela que ainda conta seus segredos como se vivêssemos ainda com 12 anos. Que todos os anos afastadas não foram o suficiente para apagar essa cumplicidade. Aquela que me estendeu a mão nervosa na nossa formatura, aquela que hoje incrivelmente é menor que eu, mas que eu me sinto pequena perto. Aquela que eu nunca esquecerei, simplesmente a minha melhor, a eterna companheira, a que eu sinto uma saudade diária.

Com enorme carinho Juliane Bastos.

Certas amizades tempo algum faz diminuir. Essa é uma delas.